por Guilherme Ribeiro, do Levante na Bahia
Nesta semana (12 a 16 de outubro) rolou na cidade de São Bernardo do Campo o I Congresso Nacional do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA). Foram cerca de 4.000 camponeses de todo o país, com uma grande presença da juventude. E aí você deve estar se perguntando: uai! um congresso de camponeses em meio à cidade das indústrias?
Essa importante inovação do MPA veio no sentido de trazer a tona o debate sobre a soberania alimentar e a aliança dos movimentos do campo com a classe trabalhadora urbana. É muito estratégico isso: neste mundo em que cada vez mais o tempo é escasso por imposição das classes dominantes, em que a maioria das/dos trabalhadoras/es da cidade perdem inúmeras horas de suas vidas num mero deslocamento pro seu local de trabalho, em que falta educação, lazer, cultura e muitos outros direitos sociais, em que a mídia monopoliza as informações e o que deve chegar aos lares brasileiros, não chega à classe trabalhadora das cidades (e mesmo do campo) a informação de que 70% dos alimentos consumidos pelo povo brasileiro é produzido pela agricultura familiar!
Os/as pequenos/as agricultores/as que alimentam o país somam cerca de 4,1 milhões de estabelecimentos familiares (cerca de 86% do total), que dependem de sua produção para a sobrevivência e ocupam apenas 17% da soma de propriedades rurais (até 100 hectares). Do outro lado, fazendas com mais de mil hectares representam apenas 1,8% das propriedades e concentram 52,2% da área total; são, em sua maioria, improdutivas, e as poucas que produzem utilizam suas terras para o monocultivo de produtos (soja, milho, eucalipto) que servirão para abastecer o mercado externo (de acordo com dados do IBGE).
Em meio à atual crise político-econômica-social pela qual passa o Brasil e a problemática da crise urbana (transporte caótico, precarização das relações de trabalho, falta de moradias adequadas, etc.), o MPA põe em destaque debates muitas vezes deixados de lado, mas que podem ser a solução para questões estratégicas do desenvolvimento nacional: a agricultura familiar emprega 74% da mão-de-obra do campo, portanto, se houvesse mais investimentos governamentais na produção com base agroecologica (que envolve desde a redistribuição de terras, os insumos, a distribuição e o consumo) e na estruturação do campo (contra o fechamento das escolas, por postos de saúde e abertura de vias de acesso para escoamento da produção), certamente teríamos uma alternativa de emprego e qualidade de vida para parte da população brasileira – além de evitar o êxodo rural, que sempre ocorre em momentos de crise. É isso o que propõe o Plano Camponês.
Porém, infelizmente é o agronegócio a praga que suga grande parte do financiamento estatal, além de contribuir para a degradação ambiental e para a insegurança nutricional da nação (utilização de sementes transgênicas e uso abusivo de agrotóxicos). Sabemos que num país em que grande parte das oligarquias permanecem no poder explorando a renda da terra, e que seus representantes compõem uma grande bancada ruralista no Congresso Nacional – estando dentre as mais retrogradas, elaborando projetos de lei que vão desde a vedação à divulgação de produtos que utilizam sementes transgênicas nos rótulos até propostas de emenda constitucional que limitam a demarcação de terras indígenas e quilombolas – os conflitos no campo tornam-se uma triste realidade em pleno século XXI.
Por isso, o lema do I Congresso do MPA “Plano Camponês, Aliança Camponesa e Operária por Soberania Alimentar” é um verdadeiro chamado para que a classe trabalhadora e a juventude urbana estreitem os laços com os movimentos populares do campo: nossas pautas estão entrelaçadas com as pautas do campo. O Levante propõe nas universidades e escolas em que estamos presentes que seus restaurantes utilizem alimentos oriundos da produção de pequenos/as agricultores/as organizados/as em cooperativas e associações, via PAA (Programa de Aquisição de Alimentos). Continuamos juntos ao MPA no enfrentamento aos setores conservadores do campo, contra a utilização de sementes transgênicas e o uso abusivo de agrotóxicos, contra o fechamento das escolas do campo, pela alimentação saudável e de baixo custo aos/às trabalhadores/as da cidade e pelo desenvolvimento social das/dos camponeses/as que com seu suor e suas enxadas, debaixo do sol quente, não deixam faltar comida em nossas mesas!