*(Periferia é periferia – Racionais MC’s)
O Carnaval acabou, mas a folia golpista segue seu ritmo frenético nos salões do Planalto. Depois da aprovação da PEC 55, que paralisará o país por 20 anos, o governo golpista investe forte para aprovar a reforma da previdência, que retira os direitos conquistados. Notícias de mais desemprego, cortes de recursos e insatisfação com a situação atual surgem a cada dia. Junto disso, assistimos a chamada “crise na segurança pública”, que assumiu centralidade na grande mídia desde o início do ano com a crise no sistema penitenciário.
A ideia de que a violência está descontrolada e de que os Estados são incapazes de enfrentá-la são as bases da construção da ideia de que medidas duras são necessárias. Entretanto, poucas são as vozes que vão na raiz do problema: o empobrecimento que as atuais medidas neoliberais estão impondo para grandes parcelas do povo e que têm como uma das suas maiores consequências o aumento da violência, principalmente nas grandes cidades.
A relação entre essas medidas e o consequente aumento da violência são mais visíveis nos Estados que, antes do golpe, elegeram governos alinhados com esse projeto – Espírito Santo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, por exemplo. O desmonte dos serviços públicos que esses governos realizam acabaram impactando as próprias forças policias, que no cotidiano usam e abusam da violência para conter os conflitos sociais. O que vimos no Espírito Santo e em parte no Rio de Janeiro dá a dimensão da atual situação explosiva em que se encontram as grandes metrópoles.
O medo de que os Estados percam suas capacidades repressivas gera pânico nas classes dominantes e em grande parte da classe média, mas não só: também nas classes populares o sentimento de insegurança gera o desejo de soluções rápidas e duras, ainda que isso seja contraditório devido à violência que a polícia promove historicamente contra o povo pobre. Portanto, em nome da segurança e do medo, a militarização do conflito tende a ser aceita por parcelas da população que, por convicção ideológica ou por descrença nas instituições, jogam suas esperanças na instituição militar, que ainda possui um certo prestígio na sociedade. Com isso, o governo federal encontrou a justificativa para o uso das Forças Armadas na contenção do conflito social para a atual situação de caos que vai se instalando com potencial explosivo. Os resultados desse processo de militarização com certeza serão desastrosos, exemplo disso é Colômbia que, a partir dos anos 90, em nome de combater as guerrilhas consideradas “inimigos internos”, militarizou sua dinâmica social.
Os pronunciamentos do ministro da Defesa e do próprio Temer deixam claro que toda e qualquer manifestação contraria as medidas do projeto neoliberal, sejam greves ou manifestações de rua, podem ser consideradas desordem e ameaças à segurança nacional e, portanto, sujeitas à intervenção militar. Resta saber até que ponto as Forças Armadas irão cumprir o papel de contenção das lutas populares contra o projeto neoliberal.
A crise é grave e atinge o nosso cotidiano, traz problemas concretos que são resultados do projeto neoliberal e que exigem de nós ações que indiquem possibilidades de mudanças nas atuais condições de vida da população que trava verdadeiras batalhas diárias pela sobrevivência. Os desafios para a esquerda e os setores progressistas serão maiores se, ao que tudo indica, o governo golpista continuar sua escalada no uso da força para implantar seu projeto. No entanto, do lado deles também aumentarão as contradições. O verniz democrático que se construiu em torno do golpe a cada dia se desfaz, deixando evidente a virada de mesa constitucional que fundamente este governo. A cena de militares reprimindo os movimentos populares nas ruas é o fim da frágil retórica oficial que as elites se sustentam.