25 de julho – Dia Inter(nacional) da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha com as Terezas, Marias e Dandaras da história e do presente.

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Muitas fugiam ao me ver… 

Muitas fugiam ao me ver 

Pensando que eu não percebia 

Outras pediam pra ler 

Os versos que eu escrevia

Era papel que eu catava 

Para custear o meu viver 

E no lixo eu encontrava livros para ler 

Quantas coisas eu quiz fazer 

Fui tolhida pelo preconceito 

Se eu extinguir quero renascer 

Num país que predomina o preto

Adeus! Adeus, eu vou morrer! 

E deixo esses versos ao meu país 

Se é que temos o direito de renascer 

Quero um lugar onde o preto é feliz. 

– Carolina Maria de Jesus, em “Antologia pessoal”. (Organização José Carlos Sebe Bom Meihy). Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1996. 

O surgimento do dia e a experiência internacional amefricana da luta das mulheres negras

O 25 de Julho é uma data que surge em 1992 com o primeiro Encontro de Mulheres Latinas e Caribenhas ocorrido em Santo Domingo, na República Dominicana. O evento foi realizado com o objetivo de debater as diferentes formas de violência que atingem as mulheres negras como, por exemplo, a violência policial direcionada aos corpos de seus filhos, a violência obstétrica ocorrida em espaços hospitalares e as condições de trabalho que lhe eram oportunizadas como inferiores à de homens brancos, mulheres brancas e, até mesmo, de homens negros, problemas esses que até o momento atual ainda sufocam as mulheres negras em situações precárias. Ainda mais, o encontro buscava propor alternativas para combater as diferentes formas de violências que atingem as mulheres negras por questões de gênero, raça e classe dentro deste recorte regional que é a América Latina e o Caribe. Assim, a partir deste encontro é criado a Rede de Mulheres Afro-latinas-americanas e Afro-caribenhas, responsável por fazer a ONU reconhecer a data como oficial através de suas reivindicações.

A comemoração da data revela ao mesmo tempo os efeitos do colonialismo combinadas as desigualdades de classe e as opressões de gênero em diferentes países do continente, como também e, sobretudo, a potência da união das mulheres negras e a construção de uma coletividade produzida através dessas várias identidades que são atravessadas por experiências similares na sua estrutura, mas distintas na sua atuação. É com isso em mente que Lélia Gonzalez compreende a Amefricanidade, uma categoria político-cultural. 

A amefricanidade é uma compreensão sobre a vivência da diáspora africana que busca abranger a todos, brasileiros, chilenos, cubanos ou estadunidenses, a América como um todo. Nesse sentido, Améfrica é uma unidade específica afrocentrada que carrega um processo histórico-cultural, ultrapassando limites territoriais, ideológicos ou linguísticos e reafirma as particularidades da experiência americana com a colonização ao passo que também reafirma seus laços com a África. A forma como a Lélia utiliza o termo demonstra dois objetivos específicos: o primeiro trata-se sobre aproximar os descendentes africanos que vivem no continente através das suas similaridades; e a segunda diz sobre denunciar o imperialismo dos EUA e a apropriação da palavra “americano” para si e não um termo que abrange todo o continente. 

Desse modo, a formulação do dia internacional das mulheres negras carrega em si essa essência de conexão entre as afrodescendentes da América Latina, entre o singular e o similar de cada uma dessas mulheres. Todavia, a escolha de palavras especificando a região “latino-americana e caribenha”, revela uma tentativa de desvincular a discussão do “topo” ou “centro” e trazer o eixo do debate para os países periféricos da América que além de sofrerem com as consequências da colonização, também são alvos do imperialismo dos EUA. 

Na fundamentação do Levante, a sua atuação segue a mesma lógica. No campo político em que está inserido, o campo popular, as referências são construídas a partir das experiências latinas, cubanas, da Ásia e África ligadas às lutas e organizações do povo, ou seja, parte do concreto da nossa realidade e do nosso cotidiano para formular a ação. E, por isso, seja pela falta de presença negra nas universidades, seja pela grande liderança de mulheres negras nas comunidades, a juventude do Levante Popular tem o papel fundamental de pensar e transformar esta realidade a partir de seus próprios territórios. 

Tereza de Benguela e a realidade brasileira

Dentro dessa imensa Améfrica Ladina, o Brasil é o país com a maior população negra fora da África. No país, a data de 25 de Julho é instituída como lei (12.987) em 2014 durante o governo Dilma, tornando-se o Dia de Tereza de Benguela e da Mulher Negra em homenagem a uma das principais lideranças quilombolas na luta contra a escravidão. 

Tereza de Benguela, conhecida como Rainha Tereza, foi uma líder quilombola que viveu durante o século XVIII no estado do Mato Grosso. Durante vinte anos, a Rainha Tereza foi a responsável por comandar o Quilombo do Quariterê, garantindo o funcionamento autossustentável do local e gestando desde questões administrativas a políticas e econômicas. O quilombo era uma comunidade próspera e autônoma com princípios democráticos que garantiam a organização e a segurança de seus mais de 100 habitantes, que consistiam entre negros e indigenas. Os registros sobre Tereza a descrevem como uma liderança corajosa e diplomática, ela transitava entre as vizinhanças buscando negociar a favor da qualidade de vida do seu quilombo além de desafiar as estruturas de poder da época, colocando-se contraria a violência da escravidão. A vida de Tereza tem um fim incerto, uns contam que foi por suicídio ao ser raptada por bandeirantes, outros que foi assassinada e teve sua cabeça exposta no quilombo que teve fim na mesma ofensiva em que Tereza faleceu. No fim, todos os registros coincidem em um ponto em comum: ela morreu como uma revolucionária na luta a favor dos direitos da população negra. 

A data, enquanto lei, permite que o Brasil se posicione criticamente em relação à condição da mulher negra no país. Historicamente, as mulheres negras brasileiras e africanas possuem um papel fundamental na construção do país, seja no trabalho do cuidado desde a escravidão sendo a elas imposta a condição de empregada e mãe preta, um estigma que segue enraizado na nossa sociedade, considerando que na época do Covid 19, conforme mostram dados da Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (CEPAL), este grupo representava 63% do trabalho doméstico remunerado ao mesmo tempo em que eram a maioria nos casos de mulheres que cuidavam da família e do lar. Por outro lado, a organização política e econômica das mulheres negras foi um dos principais pilares para a manutenção do país e a resistência do povo negro, em lideranças políticas como é a própria Tereza de Benguela e Dandara de Palmares ou no âmbito cultural e religioso como foi a importante figura da Tia Ciata no início do século XX para a consolidação do samba e do candomblé no cenário carioca.

Construção de referências – Mulheres negras brasileiras

Um bom exercício para a gente refletir nesse dia das mulheres negras e pensar a nossa luta nesse contexto sócio-histórico em que elas estão inseridas é descentralizar os nossos saberes, buscando referências ao nosso redor. 

Liderança política: Tereza de Benguela, Dandara de Palmares; Arte, cultura: Tia Ciata (Baiana, sambista e ialorixá no Rio de Janeiro); 

Ciência e Literatura: Carolina Maria de Jesus (Mineira, escritora, viveu entre as décadas de 20 a 70), Lélia Gonzalez (Mineira, antropóloga e ativista), Maria Firmina dos Reis (maranhense, abolicionista e autora de Úrsula);

Educação: Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (professora gaúcha, referência na educação em relações étnico raciais); 

Nossa militância: Daia (vice-presidência da une), Paulinha (secretaria nacional do Levante e diretora da Une), Mavi (operativa metropolitana de POA), Ana Júlia e a Jamile que constroem o Levante em São Lourenço/RS; 

Nossos territórios e as cozinhas solidárias: O papel fundamental que a tia Lúcia, do bairro Mário Quintana, e a dona Beth, na Vila Barracão/Cruzeiro, tiveram no funcionamento das cozinhas solidárias de Porto Alegre durante o período das enchentes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Gonzalez, Lélia. Por um feminismo afrolatino americano. Rio de Janeiro: Zahar, 2020. https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2024-01/historia-de-tia-ciata-reforca-resist encia-cultural-do-povo-preto 

25 de Julho – Dia Internacional da Mulher Negra Lationo-Americana e Caribenha 

Tereza: Uma líder negra a frente de seu tempo https://debenguela.com.br/blogs/news/tereza-de-benguela-uma-lider-negra-a-frente-deseu-tempo Tereza de Benguela, uma rainha que desafiou a escravidão https://www.brasildefato.com.br/2016/07/25/tereza-de-benguela-uma-rainha-que-desafi ou-a-escravidao

Dia da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha completa 30 anos de luta por igualdade

https://www.brasildefato.com.br/2022/07/25/dia-da-mulher-negra-latino-americana-e-car ibenha-completa-30-anos-de-luta-por-igualdade 

25 JULHO DIA INTERNACIONAL DA MULHER NEGRA https://levante.org.br/2016/07/25/25-julho-dia-internacional-da-mulher-negra/

 “Na pandemia as mulheres negras são símbolo de solidariedade, coragem e perseverança!” – Educação 

https://www.une.org.br/noticias/na-pandemia-as-mulheres-negras-sao-simbolo-de-solid ariedade-coragem-e-perseveranca/ 

As vozes das mulheres em luta no Sul Global