A seca histórica no norte, as enchentes no sul e o Brasil em chamas. O dia da Amazônia, 05 de setembro, é dia de denunciar quem são os inimigos da natureza e do povo, de lutar por justiça ambiental e social. Se faz urgente apontar os culpados pela crise ambiental, e entender como o modelo de produção vigente opera para a destruição da natureza e a mudança do clima.
A Amazônia é um dos biomas mais ricos em biodiversidade no mundo, essencial no enfrentamento da crise climática, para o equilíbrio do planeta e para a proteção da vida. Ao longo da história, com o processo de colonização e integração da região por meio de invasões e megaprojetos de exploração das riquezas naturais, se imprimiu uma dinâmica de desenvolvimento na região pautada na superexploração, no genocídio indígena, no ataque aos povos tradicionais, na degradação dos rios, e no desmatamento em larga escala.
O período da ditadura militar no Brasil é um marco histórico para a região nesse processo de degradação. Nesse período se adotaram políticas para integrar a Amazônia a partir de um projeto de expansão econômica e de desenvolvimento nacional através da construção de estradas, rodovias, e do incentivo à migração. Esse projeto de certa forma continua em curso. Com o avanço do agronegócio, que vê a região como uma das últimas fronteiras agrícolas, temos visto um ritmo de destruição que tem provocado significativas alterações no ecossistema amazônico. O agro que não é pop vem deixando os rastros de devastação por onde passa.
O modelo de produção capitalista, que trata a natureza como mercadoria, fez da região amazônica um quintal de exploração e de desrespeito à vida, colocando o lucro acima de qualquer coisa, em nome de um progresso que o povo só assiste passando em grandes contêineres que navegam pelos nossos rios. Esse modelo de produção hegemônico está em crise, e para sair da crise em que vive, intensifica a exploração da força de trabalho e da natureza. Existe uma prática que é estrutural do capitalismo sobre o uso da terra e a espoliação dos recursos naturais, e que se expressam principalmente na mineração e no agronegócio. O agro na Amazônia, por sua vez, avança freneticamente poluindo as água, contaminando os alimentos com o uso intenso de agrotóxicos, causando queimadas criminosas, e contribuindo para o agravamento da seca na região norte que influencia diretamente o aumento das queimadas no Pantanal, no sudeste e em outras partes do país.
Neste ano de 2024, mais de 5 milhões de hectares da Amazônia brasileira viraram cinzas. É uma área do tamanho de países como Dinamarca e Costa Rica, por exemplo. A fumaça da floresta em chamas tem chegado até a região sul. Neste ano a seca no norte, principalmente no estado do Amazonas, supera a do ano passado. É uma seca severa que impacta todo o Brasil, e altera o ciclo das chuvas.
Segundo os dados do MapBiomas, mais de 97% do desmatamento no Brasil é responsabilidade do agronegócio. Nos últimos 39 anos, a Amazônia perdeu mais de 14% da sua vegetação nativa por meio de um processo de desmatamento, e esse processo desenvolve fenômenos extremos que refletem a aceleração da crise climática que já não é mais uma preocupação das gerações futuras, é uma realidade do presente.
A crise ambiental é também uma agenda de desigualdades que atinge de modo implacável a população mais pobre de países pobres. Os desdobramentos e os impactos dessa crise atingem violentamente um povo que tem cor, endereço e gênero. E quem de fato é responsável direto disso não é afetado da mesma forma. Basta olhar os dados, os países mais ricos do planeta são responsáveis por 86% das emissões de poluentes na atmosfera, enquanto que os países mais pobres emitem 16% desses gases. Seguindo na observação dos dados, 1% de super-ricos são responsáveis por 16% das emissões de gases do efeito estufa, exatamente o dobro do percentual dos 50% dos mais pobres que é de 8%, segundo o relatório da Oxfam.
Ano que vem, 2025, a COP 30 será realizada na Amazônia brasileira, na cidade de Belém do Pará. O espaço da Conferência das Partes (COP), que deveria ser um espaço de fóruns multilaterais para que se avance na luta contra as mudanças climáticas, tem se mostrado como um balcão de negócios para o capitalismo verde. Diante de todo esse cenário, vemos que os desafios colocados para a nossa geração são enormes. Temos muita luta pela frente na disputa de projeto, espaços, corações e consciência.
É muito comum escutar depois de uma catástrofe climática que a culpa é da natureza, ou até mesmo de deus. É preciso apontar quem de fato são os culpados, e que estes paguem pela crise que provocaram. A luta ambiental que construímos tem como horizonte a superação do capitalismo. Entendemos, pois, que a solução para a crise não está no neoliberalismo verde, no ecocapitalismo, nos desertos verdes de eucalipto, no mercado de carbono, e nem numa transição energética pautada nos consensos do norte global que de justa não tem nada. Essa transição não pode ser feita às custas das águas, dos ecossistemas e dos povos. Queremos a descarbonização, queremos uma transição justa, popular e soberana.
O fim do capitalismo não virá do nada como um raio no céu azul, a salvação do planeta não virá tão somente de atitudes individuais como fechar a torneira enquanto escova os dentes. Precisamos identificar quem são os culpados pela crise e os responsabilizar. Precisamos maximizar e expandir experiências coletivas e populares como a agroecologia; economia solidária; agricultura urbana, e construir uma nova forma de se relacionar com a natureza se entendendo como parte indissociável dela. Tudo isso são passos importantes na corrida para adiar o fim do mundo e construir uma nova sociedade.