Carta aos 5 anos de vida da Rede de Cursinho Podemos+
Quando nos é permitido ter um olhar atento para o mundo percebemos que, desde a sua existência, a humanidade trilha caminhos distintos.
Nós, que vivemos do nosso trabalho, somos a cada dia, exploradas\os, silenciadas\os e adoecidas\os. Nos tratam como objetos e nos fazem competir uns com os outros tentando nos convencer de que a felicidade está em consumir, em ter mais e mais.
Dentre as inúmeras formas de impor esta visão de mundo como a única visão de mundo os opressores se utilizam, sobretudo, da educação.
Desta forma, falar sobre educação é falar sobre política, ainda que não se perceba ou mesmo que não queira. O lugar da educação nos projetos de sociedade diz muito da forma como se organiza, produz e reproduz as relações sociais.
No Brasil, historicamente, a educação foi uma ferramenta para forjar os filhos das classes dominantes como os únicos sujeitos que poderiam fazer a história e pensar a realidade. Contraditoriamente, apropriando-se de todo e qualquer saber de origem popular, apartando-o de quem o produziu. Assim, as universidades têm sido espaços excludentes e antipopulares.
No Brasil de 2018, por exemplo, 737 mil jovens não frequentavam a escola e não haviam concluído a educação básica, sendo que 64% desse grupo não chegou a concluir o ensino fundamental. Dos jovens pertencentes ao quinto da população com os maiores rendimentos 63% frequentava o ensino superior. Enquanto os jovens pertencentes ao quinto da população com os menores rendimentos apenas 7,4% estavam no ensino superior. Esses dados se acentuam quando se compara à juventude do campo, negras\os, quilombolas e indígenas.
A desigualdade social e racial em nosso país, portanto, é um projeto de poder político, em que a falta de investimento na educação pública é uma opção dos opressores. Em contrapartida, construir um projeto de sociedade diferente deste deve se tornar um dever dos oprimidos.
É preciso anunciar a nossa palavra e um novo mundo
Há quase uma década, dando consequência a todo espaço de luta popular organizado pelo Levante Popular da Juventude, temos reforçado os nossos elos de solidariedade, construindo formas que auxiliam na ruptura da condição histórica e estrutural que nos foi imposta, e que impede o acesso da juventude trabalhadora ao ensino superior.
Nossa Rede de cursinhos populares, além de herdar o compromisso com a luta pelo direito à educação pública, universal e de qualidade, se inspira nas experiências da Pedagogia Socialista e na Educação Popular, buscando tornar nosso sonho de revolução um processo cotidiano e vivo.
Para anunciar este novo mundo vai ser preciso companheirismo e humildade. Entender que somos capazes de promover mudanças no mundo, mas que elas são difíceis e a longo prazo. Assim, não são mudanças que podem ser feitas por uma só pessoa, não é uma trilha que se ande só.
Também por isso somos uma rede, um entrelaçamento de diversas experiências que se cruza no ponto comum da transformação social. E neste desafiador ano de 2022 completamos cinco anos desta vivência.
Acreditamos que a história da PODEMOS+, de cada cursinho popular que constroi esta rede, das educadoras e educadores, das educandas e educandos, suas famílias, seus bairros, enfim, a resistência dos que vivem do próprio trabalho e as conquistas do povo devem ser comemoradas.
A alegria em construir o amanhã
O festejo de 5 anos da PODEMOS+ é um momento muito importante para nós, carregado de histórias, acúmulos, reflexões e, principalmente, da mística envolvida em nossa construção. O caminhar da PODEMOS+ só faz sentido na construção de um novo mundo e uma nova sociedade.
Todo nosso trabalho organizativo, pedagógico e político deve ser construído junto ao povo oprimido, que tanto sofre com as mazelas de nossa sociedade, a falta de direitos básicos e a mínima dignidade. É preciso ser povo. Nossos cursinhos precisam ser parte da vida do povo, ser referência na educação e um espaço de diálogo sobre nossos problemas e como melhoramos nossas vidas.
O estudo continua sendo uma importante ferramenta para a construção do amanhã. A prática é que nos dirá sobre os caminhos possíveis e os que não nos cabem. As reflexões para o amanhã vêm da combinação de estudo e prática. O amanhã vai nos exigir palavras, mãos, mentes e corações. Vai nos exigir a vivência e a leitura. A escrita do futuro será feita por nós, cheia de desafios, mas com alegria viva do que será.
E alguns podem nos perguntar: de onde tirar tanta esperança? Nossa resposta deve vir de nossa consciência sobre o papel de educadoras e educadores populares. Nossa resposta deve vir do ânimo que nos dá um bom debate em sala de aula. Nossa resposta deve vir da força que emana do povo se fazendo sujeito de sua história. Nossa resposta deve vir de um acurado senso de justiça, num país onde reinam milionários enquanto lascam as trabalhadoras e os trabalhadores. Nossa resposta deve vir da mística, que renasce em tempos de desesperança e nos força a caminhar adiante. Nossa resposta deve vir da busca por uma verdadeira liberdade, não para poucos, mas para todas e todos.
Que o amanhã não nos seja um fardo, não nos seja uma obrigação. Que nos seja o sonho, a busca pela igualdade em nossa sociedade. Que o amanhã seja fruto de nossas raízes, de nossa história e de outras lutadoras e lutadores do povo que nos conduziram até aqui.
Não há o que temer em construir o amanhã. Ele já está em construção. A educação popular que construímos mira o futuro da liberdade de nosso povo. Que o latifúndio da universidade tenha suas cercas rompidas e que a universidade construa seu papel de agente modificadora da sociedade. Não há o que temer em construir o amanhã. Não nos é mais uma opção, é ontológico!
Autoria:
Lorhana Lopes, militante do Levante e da equipe nacional da PODEMOS+
Leonardo Paes, militante do Movimento Brasil Popular e da secretaria nacional da PODEMOS+