Os movimentos sociais estão sendo imprescindíveis diante da urgência que as enchentes trouxeram ao Rio Grande do Sul. O trabalho das organizações, que repetem a atuação realizada durante a pandemia da covid-19 e na enchente no Vale do Taquari em 2023, trazem uma perspectiva de maior continuidade do que as também importantes iniciativas voluntárias emergenciais que a população em geral vem assumindo nos últimos dias.
Entre os vários desafios está alimentar tanta gente acolhida em abrigos, voluntários que dedicam seu tempo a ajudar nas tarefas urgentes e também moradores de regiões mais vulneráveis que sofrem de diferentes formas os impactos da catástrofe climática. Missão assumida pelos militantes do Levante Popular da Juventude no estado. Já são 11 cozinhas em 8 cidades atingidas pelas enchentes, e o plano é ampliar mais.
O trabalho do movimento na vila Barracão, em Porto Alegre, no local batizado de Cozinha Solidária da Juventude, iniciou ainda antes da cidade ser inundada, em 1º de maio, Dia do Trabalhador e da Trabalhadora. Começou de forma simbólica distribuindo marmitas para moradores do território e foi ampliado quando as pessoas começaram a ser retiradas de suas casas. É o que conta a psicóloga Mariana Danbroz, integrante da coordenação do Levante no RS.
“No dia 3 de maio a produção iniciou pra valer, com uma média de 400 marmitas por dia. Hoje, a produção é de cerca de mil marmitas por dia, que são entregues em abrigos, para pessoas de territórios afetados diretamente pelas chuvas. A gente tem territórios aqui em Porto Alegre de extrema vulnerabilidade, que ficaram sem água, sem luz”, conta.
O trabalho da cozinha no prédio da União de Vilas da vila Barracão (rua Dona Helena, 100) inicia todos os dias às 7h30 e só encerra às 20h. Cerca de 30 pessoas contribuem ao longo do dia na produção de 500 marmitas no almoço e 500 no jantar, na entrega das quentinhas e na limpeza e organização.
Uma das cozinheiras da Cozinha Solidária da Juventude é Elisabete Lopes da Silva. Conhecida como Dona Bete, é aposentada e vive há 40 anos na vila Barracão. “Amo trabalhar na cozinha”, afirma, recordando dos 18 anos em que atuou nessa função. Ela se emociona ao falar da iniciativa que está reunindo os jovens do Levante a também moradores da região, que reconhecem a importância do trabalho realizado.
“Cada um que eu encontro diz que admira muito os esforços da gente, porque não imaginava essa força que a gente tá desde o dia primeiro aqui nessa batalha pra atender o próximo. Tá sendo bem gratificante aqui, a comunidade tá vindo aos poucos, vem buscar comida. Como eu já conheço, já vou convidando, ‘se tiver um tempinho e puder dar uma força’. No outro dia estão aqui”, conta.
Dona Bete diz conhecer vários vizinhos que estão abrigando famílias em suas casas na região. “Temos uma família abrigada aqui na esquina, do Humaitá. Hoje eu descobri que tem mais uma família para o lado aqui da Cruzeiro. Então, para ajudar eles, me sinto muito gratificada por tudo isso, pela ajuda, e pelos jovens do Levante também que estão vindo em massa para ajudar.”
Militante do Levante, Fabrício de Farias Garim ajuda como voluntário na cozinha nas tardes, depois de terminar seu trabalho de entregador em uma farmácia pela manhã. “É um trabalho importante para a nossa cidade nesse momento de vulnerabilidade, para unir as pessoas, ajudar também os mais necessitados”, afirma.
Para ele, a experiência vai ficar marcada. “Aprendi muita coisa dentro da cozinha, vou sair feliz porque a gente vai conseguir vencer essa luta e vamos ficar felizes por ter ajudado todos que precisaram”, comenta o jovem morador da Cruzeiro. “A gente tá no Levante, tá aprendendo com os mais velhos. Tamo aí pra aprender e ensinar também”.
Levante quer ampliar a rede de cozinhas solidárias
Segundo Mariana, a Cozinha Solidária da Juventude é “o coração das cozinhas” do Levante. É lá, da vila Barracão, onde chegam as doações que são distribuídas para outras cozinhas na região Metrotolitana.
“A gente tá com a Cozinha da Juventude, tem a Cozinha da Tia Bete na Bom Jesus, a Cozinha da Tia Lúcia no Mário Quintana. A gente abriu também uma cozinha em Viamão, na Cecília”, enumera a militante. São 11 cozinhas em oito municípios em todo o estado.
Em todas ela, há a preocupação de entregar diariamente uma alimentação de qualidade, a partir de mantimentos adquiridos através de doações via Pix do movimento e de doações recebidas do MST e de sindicatos parceiros. “Não é só arroz e feijão, a gente sempre tenta ter legumes junto, tenta ter uma verdura, pra ser um alimento rico nesse momento em que as pessoas estão com a saúde muito fragilizada”, comenta Mariana.
Ela ressalta que doações são mais que bem-vindas para a continuidade da ação. “A gente precisa de legumes que é uma coisa que vai muito rápido, de arroz, feijão, molho de tomate, temperos. E carne que acaba sendo o mais caro, e a gente tem usado em torno por turno 50 quilos por turno. Então é um alimento que vai muito rápido.” O Pix para quem quiser contribuir é 51 999726020, em nome da Mariana
A expectativa é de ampliação das cozinhas do Levante, chegando a 15 unidades pelo estado até o final de maio. “Tem várias frentes que a gente vai estar atuando nesse processo de catástrofe, que a juventude ela vai precisar estar organizada, estar atuante. Então a gente quer aumentar o nosso número e para isso, além das doações, a gente precisa de mãos, muitas mãos pra conseguir garantir que essa quantidade de marmita seja produzida por dia e que seja entregue de forma rápida.”
Cozinhas do Levante atualmente em funcionamento:
Cozinha Solidária da Juventude – Vila Barracão, Porto Alegre
Cozinha Comunitária da Tia Bete – Bom Jesus, Porto Alegre
Cozinha Comunitária da Tia Lúcia – Mário Quintana, Porto Alegre
Cozinha Solidária da Cecília – Viamão
Cozinha Solidária de Sobradinho
Cozinha Solidária de Rio Pardo
Cozinha Solidária do Itararé – Santa Maria
Cozinha Solidária da Dom Ivo – Santa Maria
Cozinha Solidária e Unitária de Pelotas
Cozinha Solidária da Juventude de Santa Cruz do Sul
Cozinha Solidária da Juventude de Erexim – Erechim
Confira algumas fotos das cozinhas feitas pelos próprios militantes:
Via: Brasil de Fato Rio Grande do Sul