Lucas Pelissari, militante do Levante Popular da Juventude e da Consulta Popular de Curitiba
O vexame causado pelo governador tucano Beto Richa, aliado a um judiciário conservador, à polícia militar fascista e a uma maioria parlamentar conservadora anti-povo, é indiscutível. As dimensões do vexame são internacionais e repercutiram nos maiores meios de comunicação do mundo. Nem a grande mídia brasileira, que chegou a defender a ditadura militar e, junto com o PSDB, sempre foi a favor da repressão aos movimentos sociais conseguiu esconder ou explicar a barbárie. Dessa vez, o argumento do “vandalismo” não colou (embora Beto Richa insista em recorrer à suposta atuação de black blocs para justificar as ações de seu desgoverno em Curitiba na última semana), nem com a classe média avessa atualmente a qualquer tipo de manifestação que não seja “Fora, PT!”.
No dia 29 de abril, enquanto servidores públicos, estudantes, professores e trabalhadores em geral se mobilizavam na “praça dos três poderes” do estado do Paraná para reivindicar direitos, os deputados corruptos eleitos pelo grande poder econômico votavam um projeto de lei que representa um verdadeiro retrocesso histórico para a aposentadoria de cerca de 30 mil funcionários públicos estaduais. Com o argumento de “cobrir o rombo no orçamento do estado”, Beto Richa, apoiado pelo presidente da ALEP Ademar Traiano (também do PSDB), fez de tudo desde o início do ano para aprovar a qualquer custo o projeto, que repassa aos próprios servidores parte do pagamento da previdência social – mais uma vez, a crise é dos ricos e o trabalhador é quem paga a conta.
Já na madrugada do dia 28 para o dia 29, a PM blindava a ALEP para não permitir que a pressão social interferisse na decisão dos parlamentares durante a votação do dia seguinte (o que, por si só, é anti-democrático – as grandes empresas interferem desde a escolha dos candidatos para as eleições, mas o povo trabalhador, o principal afetado pelo que é votado no legislativo, é recebido pela polícia militar simplesmente por manifestar desacordo com a opinião de um governo). Mas, até aí, são apenas cenas de um filme visto há décadas recorrentemente.
Acontece que Beto Richa (já chamado por grande parte da população do Paraná, inclusive seus eleitores, de Beto Hitler) não se contentou em seguir a simples cartilha dos governos de seu partido: aliar-se à grande mídia, reprimir alguns manifestantes, construir um discurso com verniz popular que faça parecer que o projeto é bom, além de comprar alguns parlamentares que já estão acostumados a se vender para as grandes empresas que ganham com o programa tucano de privatizações; se fizesse isso, aprovaria o projeto tranquilamente, tachando os movimentos sociais de baderneiros e publicando uma foto de manifestantes mascarados para dar mais legitimidade à decisão. Porém, destilando seu conservadorismo fascista e com a cara lavada que conquistou mais de 70% dos votos na última eleição ao governo do Paraná, o governador do estado optou pelo massacre. E não só um massacre político. Um massacre físico, proporcionado pela utilização de um efetivo de mais de mil policiais militares oriundos de diversas cidades do estado, mais de 1500 bombas de gás lacrimogêneo e até helicópteros. Antes mesmo do massacre, a Praça Nossa Senhora de Salete já era pintada por um cenário de guerra. O resultado: mais de 200 manifestantes feridos e a prefeitura de Curitiba, que fica próxima ao local, servindo de um grande ambulatório improvisado. Um deputado opositor ao projeto de Richa, ao tentar conversar com os manifestantes, foi mordido por um cachorro da polícia e até embaixo de uma cadeira de rodas foi arremessada uma bomba de gás lacrimogêneo.
No plenário da ALEP, sob a afirmação de que “O que acontece lá fora não é problema desta Assembleia”, Traiano não paralisava por um minuto sequer a votação e levou-a até o fim, possibilitando 31 votos parlamentares a favor do projeto e 20 contrários. A força desproporcional do estado foi usada para reprimir a manifestação da população, seguramente contrária ao projeto em sua ampla maioria, e garantir que três dezenas de parlamentares fizessem a vontade de Beto Richa e dos interesses que os governos tucanos representam.
Isso coloca uma realidade à tona: existem aparências que vão além da cara lavada atrás da qual Beto Richa esconde seu fascismo. A podridão que sustenta o atual sistema político, que ainda herda regras da ditadura militar, está em todos os âmbitos da vida política brasileira: no legislativo, no judiciário, na segurança pública. A defesa de uma reforma política popular passou a ser uma questão de vida ou morte para a democracia brasileira. É tão notória a vontade da população em reformar o sistema político que até o PSDB e o PMDB bolaram mais uma aparência para esconder seus interesses: uma reforminha política (PEC 352, em tramitação), defendida pelo presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, que em nada altera o sistema político e não muda sequer a maneira como as campanhas eleitorais são financiadas. Não se pode ter dúvidas sobre os interesses que orientam a política de Eduardo Cunha: são os mesmos de Beto Richa e ele também fará de tudo para aprovar a tal reforminha. Só que dessa vez com o apoio dos deputados federais, os mesmos que pouco se importam com as condições de trabalho do povo e aprovaram, seguindo as ordens dos empresários, o PL 4330 da terceirização.
“Reforma política” e “popular” são termos indissociáveis nesse contexto. É o povo quem deve decidir sobre os rumos do sistema político brasileiro e não os próprios parlamentares e congressistas de rabo preso com Richas e Cunhas; não os representantes do agronegócio, dos grandes bancos, das grandes indústrias, ou seja, os verdadeiros corruptores que transformam as eleições em um verdadeiro balcão de negócios e não têm nenhum compromisso com a democracia.
Quase 8 milhões de brasileiros/as já deram sua opinião: queremos uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político, um fórum composto por representantes do povo para reformar o Sistema Político em sua essência. A campanha do Plebiscito Popular pela Constituinte, organizada informalmente com trabalho voluntário de mais de 40 mil ativistas e 500 entidades da sociedade civil, realizou, de 01 a 07 de Setembro de 2014 um verdadeiro exercício de democracia. Organizou, através de comitês populares, atividades como oficinas de debate, plenárias, grupos de estudo sobre o sistema político. Comunidades, igrejas, sindicatos, escolas de todos os estados do Brasil puderam participar e ouvir a opinião da população sobre a convocação da Constituinte Exclusiva. Tudo sem o apoio da grande mídia e do poder econômico.
A experiência mostrou que basta ouvir o povo e romper com os vínculos podres que orientam esse sistema político para que os verdadeiros interesses da população passem a fazer parte da vida política brasileira. Essa é a única forma de garantir que o que seja votado nas assembleias legislativas não se dê à revelia da população. É a única saída para não vermos o vexame produzido pelo desgoverno de Richa ser repetido em outras assembleias legislativas e no Congresso Nacional. É o que garantirá que os recursos públicos que tentam diariamente nos roubar seja utilizado para melhorar salários de professores e não para comprar estoques de bomba de gás lacrimogêneo e bala de borracha. É a única forma de melhorar a educação, a saúde, o transporte público!
Contra a repressão, Constituinte é a solução!
Constituinte quando??? Já!!!