Por Guilherme Ribeiro e Claudio Carvalho
Iniciamos a segunda semana do governo golpista capitaneado por Michel Temer e os “santinhos”, e agora estamos vivendo a “Nova República Federativa do Brasil Livre de Corrupção”. O golpe foi um duro atentado à democracia e a estabilidade das instituições nacionais. O golpismo esfacelou o pacto Constituinte de 1988 e o novo período que se abre é de intensa incerteza a respeito do futuro do país e dos avanços sociais dos últimos anos.
Antes mesmo da votação no Senado que decidiu pelo afastamento da presidenta Dilma Roussef, Temer já se reunia e discutia deliberadamente com uma série de “notáveis” a fatia que caberia a cada um nos ministérios, tudo em troca, é claro, de apoio parlamentar após a consumação do golpe. Sob as vistas pouco criteriosas da mídia e dos movimentos “contra a corrupção”, os “notáveis” negociavam publicamente. Resultado: diversos ministros nomeados são investigados pela lava-jato; outros não têm histórico nenhum de atuação na área que foram empregados, além do fato mais abominável: um ministério composto exclusivamente de homens brancos, sem qualquer representatividade!
O nomeado para o Ministério da Educação (com a tentativa de agregar também a Cultura) foi o deputado federal e líder da bancada do DEM Mendonça Filho. Um breve histórico do rapaz: filho de oligarquias do Pernambuco, está na vida política desde os 20 anos, quando foi eleito deputado estadual. Logo em sua primeira participação no Congresso Nacional, em 1995, propôs a emenda constitucional que permitiu a reeleição para os mandatos no poder executivo. Àquela época é sabido que muito dinheiro rolou para comprar deputados resistentes à proposta, que beneficiava diretamente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Deputados denunciaram a oferta de R$200.000,00 (duzentos mil reais) por voto. Obviamente que a proposta foi aprovada, FHC foi reeleito, e o caso nunca foi investigado. Porque será?
Vale a pena também um breve histórico do partido ao qual faz parte, o DEM(o): o DEM é a nova denominação do antigo PFL, que por sua vez é a denominação do antigo ARENA, partido que representava os interesses dos ditadores, das elites e dos Estados Unidos durante os períodos de chumbo. O DEM historicamente foi contra projetos sociais, sobretudo no que diz respeito à educação: foi ao STF alegar a inconstitucionalidade do programa de Cotas nas universidades públicas (o STF reconheceu a constitucionalidade, diga-se de passagem, de forma unanime), bem como para impedir a destinação de recursos para o FIES e Prouni. Agiu incessantemente para barrar a votação da destinação dos royalties da exploração do pré-sal para educação e participa ativamente de projetos de lei que pregam um currículo conservador nas escolas brasileiras.
Com esse histórico macabro, não é difícil dizer que as perspectivas para a educação pública brasileira são as piores possíveis no governo-golpista Temer.
Dentre as primeiras medidas estão:
– incorporação do Ministério da Cultura ao da Educação, tirando sua autonomia de gestão e financeira. Graças ao movimento popular iniciado por milhares de artistas no Brasil inteiro, Temer voltou atrás e decidiu recriar o ministério da Cultura. Mas essa sinalização de unificar os ministérios demonstra o pouco apreço que os golpistas têm pela valorização das manifestações culturais do povo brasileiro.
– nomeação para a secretaria de Regulação e Supervisão do Ensino Superior do economista Maurício Costa Romão, que possui ligações com o grupo Ser Educacional, dona de uma das maiores redes de universidades privadas do país. Essa nomeação significa entregar nas mãos do setor privado a prerrogativa de escolher em quais universidades, públicas e privadas, devem ser abertas novas vagas. Precisa de resposta?
– nomeação de Maria Helena Guimarães de Castro e Maria Inês Fini, ambas militantes do PSDB, para assumir a Secretaria Executiva do Ministério e o Inep respectivamente. Com ideias extremamente meritocráticas, podem representar um retrocesso na política de currículo e no ENEM.
– e a nova competência da Educação, que é a delimitação e demarcação das terras dos remanescentes das comunidades dos quilombos (?). Isso significa que Temer entregou nas mãos do DEM, que integra a bancada ruralista no Congresso, a competência para demarcação de territórios de comunidades historicamente perseguidas por tais figuras. Fora que o Ministério não tem profissionais técnicos para tal prerrogativa. Retrocesso sem tamanho!
Além dessas medidas, outras estão em curso na plataforma “Ponte para o Futuro” do PMDB (mais conhecida como Ponte para o Passado) e no Congresso Nacional, tais como:
– Proposta de acabar com a vinculação das receitas obrigatórias da União, Estados e Municípios para Educação e Saúde (“Ponte para o futuro”, pg. 09);
– Emenda Constitucional que possibilita às universidades públicas cobrarem pelos cursos de extensão e de pós-graduação (proposta por Alex Canziani, do PTB);
– Abertura do capital da Petrobras (privatização) e revisão do marco regulatório da partilha do pré-sal (encabeçada por José Serra-PSDB), que significa o fim dos royalties do fundo social do pré-sal para a educação e saúde;
– Projeto de lei “Escola sem partido” (apresentado pelo deputado Izalci, do PSDB) que propõe a “neutralidade” do professor com o fim das discussões políticas nas escolas e a proibição de manifestações estudantis em ambiente escolar;
– Proibição da discussão sobre gênero e diversidade sexual dentro dos princípios de Planos Nacional, Estaduais e Municipais de Educação (encabeçado pela bancada evangélica);
– Possibilidade de revogação da portaria que estabelece prazo para que as instituições de educação superior apresentem propostas de ações afirmativas – com inclusões de negros, pardos, indígenas e pessoas com deficiência – em seus programas de pós-graduação.
Parece desesperador, mas existe saída. As manifestações dos/das artistas pela reconstrução do MinC, as ocupações feitas em milhares de escolas públicas do país inteiro e protagonizadas por estudantes secundaristas contra o sucateamento da educação, as diversas manifestações dos movimentos populares e escrachos realizados contra os golpistas, como vêm realizando o Levante Popular da Juventude, demonstram que o povo organizado e em luta nas ruas pode desfazer a farsa do governo interino e reconstruir o caminho democrático destruído pelos golpistas.
As manifestações populares devem canalizar para uma luta maior e unitária, que é a convocação de uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana para reconstruir o sistema político e a nação brasileira, com representantes eleitos exclusivamente para esta finalidade e livres do poderia econômico das empresas, dos latifundiários e dos banqueiros. Do contrário, a barbárie continuará e enfrentaremos um período de grave instabilidade social.
Não ao golpe! Fora Temer!
* Guilherme Ribeiro é mestrando em educaçao pela UESB e militante do Levante Popular da Juventude. Claudio Carvalho é Professor de Direito da UESB;