O grande sociólogo brasileiro Florestan Fernandes certa vez escreveu um texto no jornal Folha de São Paulo, em 1986, cujo título é: “O dilema político dos jovens”. Lendo esse texto é impossível não achar que ele falava para os jovens de hoje.
Atualmente, ninguém mais pode analisar a conjuntura política ou mesmo a correlação de forças na sociedade brasileira sem fazer referência necessária a eventos políticos nos quais a juventude teve certeiro protagonismo. A começar pelas “jornadas de junho” de 2013. Embora parte da esquerda insista no seu caráter conservador, de direita, fascista e “coxinha”, e também não desmerecendo a constatação óbvia de que a mídia e a direita também lograram alguma influência nas mesmas, é incontestável que aqueles eventos partiram de um genuíno sentimento de justiça e da luta por direitos. No sobrevôo daquelas cabeças sob as cartolinas coloridas as pautas eram “educação pública”, “Mais verba para saúde”, “passe livre”. Ou seja, as pautas centravam-se na reivindicação de “Mais Estado”, indo na contramão do discurso hegemônico e liberal que o associa com ineficiência, excesso de gastos e corrupção.
Os jovens também aprenderam – mesmo que à sua forma – a desafiar as elites e o poder judiciário nos seus “rolezinhos”, explicitando o conflito racial e de classe na sociedade brasileira. A juventude também protagonizou os “escrachos” aos torturadores da Ditadura Militar, denunciando-os publicando nas suas casas ou locais de trabalho, fazendo justiça com as armas que possuem: as palavras de ordem!
Por fim, como esquecer os jovens secundaristas, que do auge dos seus 14 e 15 anos, ousaram impor uma derrota histórica ao PSDB no estado de São Paulo, fazendo-o recuar – pelo menos provisoriamente – do projeto de reorganização das Escolas.
Em que pese esses fatos, ainda é corriqueiro – sobretudo em parte da esquerda – a ideia de que a juventude está menos apta para as tarefas de formulação política e seus papel restringe-se à agitação. Além disso, permanece a imagem pejorativa de que os jovens são despolitizados, individualistas, consumistas e acomodados. Prevalece aquele saudosismo nostálgico de que boa mesmo era aquela geração da rebeldia dos anos 60, da guerrilha contra a ditadura, das Diretas Já, do Novo Sindicalismo, do Fora Collor…
Para dialogar com esses que insistem em estigmatizar os jovens – sobretudo àqueles que descobriram outros instrumentos e estratégicas alternativas de luta política – uma frase de Florestan Fernandes: “Hoje o jovem retorna aos seus papéis, em um Brasil diferente, e não deve ficar encantado por um passado que não pode ser reconstruído e não foi tão legendário ou heróico como as idealizações sublinham.”
Ou seja, a luta de classes e a esquerda brasileira necessitam de novas formas de reinventar seu diálogo com a sociedade e sua atuação política. Os jovens têm mostrado caminhos, resta-nos extrair aprendizados e ter a humildade de encarar nossos limites históricos.
Por fim, ainda Florestan, “O potencial radical de um jovem constitui um agente político valioso. Ele está ‘embalado’ para rejeitar e combater a opressão sistemática e a repressão dissimulada, o que o converte em um ser político inconformista e promissor”.